Boticas e beberagens: a criação dos serviços de saúde e a colonização da Guiné

Philip Havik

Resumo


No quadro da reforma da administração ‘colonial’ na Guiné no primeiro quartel do século XIX, criaram-se os primeiros serviços de saúde no distrito então ainda tutelado pelo governo de Cabo Verde (até 1879).
Com poucos meios e facultativos, a assistência médica estava principalmente virada para atender os habitantes dos presídios ou praças da Guiné e das forças militares ali colocados. A população mais abastada
pouco concorria para beneficiar dos seus cuidados por terem regra geral
as suas próprias boticas, enquanto a grande maioria recorria aos curandeiros, cujos tratamentos eram muito apreciados no interior. Os
médicos ali destacados que regra geral vieram de outras colónias portuguesas como Cabo Verde e Goa, iniciaram um processo de aprendizagem das patologias tropicais através do contacto com os presídios, embora, mas raramente, com povoações na sua periferia. A guerra de ocupação travada durante varias décadas contra o ‘gentio rebelde’ alargou o seu campo de acção e acelerou o intercâmbio de saberes que não se limitou a medicina. Assim surgiram os primeiros estudos etno-biológicos que, além de preencher grandes lacunas na ciência médica de então, ficaram profundamente marcados pelo contexto conflituoso em que nasceram.
Ao reproduzir abordagens coevas em torno de conceitos de cidadania e etnicidade, mas também os ensinamentos da geografia e climatologia de saúde, os seus relatos deixaram um rasto significativo na antropologia colonial da região. Porém, os médicos não formaram um grupo coeso e mostraram divergências no que dizia respeito as patologias e as curas a aplicar, além de discutir a questão da colonização da região. A sua actuação e os relatos por eles produzidos se revestem de suma importância para uma melhor percepção de uma ciência em formação, mas também para medir o impacto da etno-geografia e bio-medicina sobre o discurso colonial da época.

Palavras-chave: Medicina tropical, curandeirismo, colonização, campanhas militares, aclimatização, imunidade, etno-biologia, antropologia, Guiné, Cabo Verde, Goa


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